Eu sou do tempo em que cartas de amor eram a única saída pra
a timidez. E todos eram tímidos. No meu tempo, a vida era tão complicada. DVDs
de black comprados na feira eram os coreógrafos de qualquer pobre, porque só
haviam professores de dança nas escolas de dança. No meu tempo, o amor era só
de mãe, mesmo a gente sempre achando que não. Mesmo que a paixão nos visitasse
a cada esquina, mesmo que a faísca de qualquer sorriso acendesse uma brasinha
no coração. No meu tempo, dor de verdade era arrancar o tampão do dedão no
asfalto tentando chutar uma bola. No meu tempo a esquerda era mais esquerda, e
a direita era mais direita. Muito embora a única política de que se entendia
era a Política da Boa Vizinhança. No meu tempo, o maior desafio que existia era
falar paralelepípedo bem rápido, mesmo sem fazer idéia do que essa palavra
significa. E as palavras significavam muito. No meu tempo, a medicina era
avançada. Eles estavam próximos de descobrir a cura para doenças mortais, como
o câncer, a AIDS, a inveja e o amor. No meu tempo, não era difícil fazer a
lição de casa, ou não ficar grávida antes dos 15 – difícil mesmo era passar a
fase aquática do Mario. E Mario não tinha nada a ver com armário, ou coisa
assim. Mario era o que todo mundo queria ser: um cara simples, com super
poderes, e que bastava seguir uma lógica simples pra encontrar sua princesa
ideal. No meu tempo, já não se faziam mais doce de abóbora como antigamente,
geléia como antigamente, chocolate como antigamente; mas, poxa, como a vida era
doce!
No meu tempo, nostalgia era coisa de velho. Se hoje em dia
está tão na moda, é porque nós, realmente, não temos do que nos orgulhar no
presente.