sexta-feira, 27 de maio de 2011

Monumentos à Tristeza


A cidade, sonolenta,
se movia devagar
Casada de produzir,
cansada de trabalhar

As pessoas já não andavam,
se arrastavam pelas ruas
Todos na solene marcha,
via sacra às casas suas

Em meio a esse burbúrio,
houve um grande alarido
Um anúncio de algo novo
que atingiu a todo ouvido
Era com grande volume
Era com grande euforia
Que, aos quatro cantos da cidade,
o anunciante assim brandia:

- Venham, venham! Venham todos
Vejam como é ser coitado
No novo monumento à solidão
À tristeza e ao rejeitado

- É uma escultura, com certeza
Mas, não foi feita por Aleijadinho
O fato é que seu coração
Ele sim já não anda sozinho

- Ele ergue o rosto e suspira
Suspira e ergue o rosto
Engole seco, e faz cara feia
Como se ainda sentisse gosto

- Seu olhar parado no ar
É o que causa maior comoção
Em nenhum lugar do mundo
Jamais se viu tão formidável atração

- Venham, venham! Venham ver!
E saibam agora do que é mais triste:
É por culpa dessa atração
Que toda a tristeza nela reside!

Ninguém que saía do centro
deixou de ouvir a gritaria
Alguns foram conferir,
ver a estátua que nunca sorria


Porém, a maior parte das pessoas
Nem se interessou pelo monumento
Preferiram voltar pra casa,
pra sua tranqüilidade rasa
Ou para seu bairro agourento

A estátua ficou sozinha
quando acabou-se a claridade
pois, de todas as luzes do shopping
nenhuma se manteve acesa, por caridade

A estátua se moveu
Viva ou morta, tanto faz
Pois quem tem dos sentimentos
Só as dores e os tormentos
É porque não vive mais